segunda-feira, 24 de maio de 2010

A dura realidade da Zona do Euro

SERGIO BARRA

O maior obstáculo da vida é o medo. Para dizer a verdade, as pessoas estão assustadas nos Estados Unidos e na Europa. É a dura realidade que vivem no momento tanto americanos quanto europeus. Na América, as injeções de liquidez e os programas de compra de ativos podres não fizeram pouco. Além de construir um piso para a deflação de ativos, as intervenções apagaram as culpas do espírito dos pecadores, que, com a ajuda do governo, lograram vencer o colapso da confiança.
Já no Velho Mundo, depois de um período de subterfúgios ideológicos e negaceios políticos, as lideranças européias trombaram com a dura realidade. Até mesmo os austeros alemães deram-se conta de que suas virtudes (sobretudo a saúde de seus bancos) estavam ameaçadas pelo colapso dos sinistros gastadores gregos, espanhóis e portugueses.
A recriminação cedeu lugar ao pânico, na proporção em que os mercados mostravam os dentes e jogavam a cotação do euro ladeira abaixo. Para os senhores das finanças, pouco importa que tenham sido salvos pela vigorosa intervenção da agência do Estado encarregada da gestão da moeda e do crédito.
Na Eurolândia, que conta com a ajuda do FMI, montou um pacote trilionário que adia a crise européia, mas não resolve os problemas que a criaram. Esse pacote de 750 bilhões de euros - quase 1 trilhão de dólares - contra a crise de confiança na Zona do Euro é, em princípio, uma boa notícia. Essa política de austeridade tem aumentado a corrida ao salário desemprego.
Foram precisos dias de pânico e volatilidade nos mercados financeiros, mas, após muita irresolução e muita má vontade, os lideres europeus despertaram para a realidade - a crise não é da Grécia, é da Europa - e anunciaram uma resposta minimamente proporcional ao problema.
Mas a austeridade tem provocado muitos protestos na Europa. Esse pipocar de insatisfação atinge a Espanha, funcionários públicos saíram às ruas para protestar contra a redução de salários e congelamento de aposentadorias previstas no plano de severidade. Na Grécia, mais de 20 mil trabalhadores fizeram protestos durante a quarta greve geral contra a reforma do sistema previdenciário e do plano de austeridade.
Enquanto isso, a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, defendeu uma férrea disciplina fiscal na Europa, através de propostas controversas que vão desde as sanções à expulsão - o que é pouco provável - da união monetária para reforçar o Pacto de Estabilidade, que tem como objetivo limitar déficits públicos, mas que não foi levado a sério por alguns países durante a grande crise.
O plano foi apresentado mais como uma rede de segurança para governos em dificuldade financeira, mas o que realmente motivou essa articulação de dimensão e agilidade sem precedentes foi o risco que corriam seus credores: com a quebradeira geral dos bancos franceses, espanhóis, italianos e alemães.
Como em 2008, trata-se de salvar bancos credores, não os endividados, antes família, agora governo europeus. Papéis rebaixados a "lixo" especulativo - neste caso, títulos de dívida pública e não de hipotecas privadas - serão garantidos ou comprados por governos da Europa ou pelo Banco Central Europeu (BCE). Configurando o segundo socorro trilionário ao sistema financeiro europeu em pouco mais de um ano, cuja necessidade foi, em boa parte, gerada pelo peso do primeiro resgate sobre as economias e os orçamentos e dividas públicas de todos os países europeus.
Ainda há dúvidas como o dinheiro será usado. O plano não faz nada, porém, para enfrentar as causas da crise, os desequilíbrios que lhe deram origem. Os limites de Maastricht não foram levados em conta. Muitos não os respeitaram e os que o fizeram não se saíram melhor. Moral da história? A Espanha teve contas mais equilibradas que a Alemanha, mas é "punida" como a Grécia.
São sinais de que a Zona do Euro ainda está demasiado obcecada pela ilusão do mercado desregulamentado e do BC independente para debater com clareza como impedir o colapso a médio ou longo prazo, que reduziria tais preocupações a questões acadêmicas.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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